INTRODUÇÃO


Tudo começou lá pelos idos de 1989, onde eu lecionava matemática em uma escola de 2° grau. Era uma sexta-feira e os dois últimos períodos da noite sempre eram de matemática, física ou português, pois se colocassem outras disciplinas não ficava ninguém. Numa das aulas, em um intervalo, um aluno meu indagou-me sobre o que eu sabia de patentes. Prontamente respondi o que se aprendia na engenharia: o básico do assunto. O aluno me disse: “serve”. Ele trabalhava como vendedor em uma empresa do ramo, captando clientes que necessitassem do serviço em marcas e patentes. Convidou-me para conhecer a empresa e conversando com seu titular acabei aceitando o trabalho de redator em patentes. Gostei do assunto e dediquei-me: cursos, legislação, técnicas de redação e outras necessidades. Quando terminei e engenharia, eu e minha futura esposa, resolvemos montar uma empresa especializada no assunto. Ela ficaria com o administrativo (para o bem de todos, pois eu não sei nem pedir cheque em banco) e eu ficaria com a parte de patentes. Depois de duas décadas nesse trabalho e milhares de patentes redigidas, veio a ideia de selecionar as mais originais e publicá-las numa espécie de anedotário. O objetivo é mostrar a grande criatividade do brasileiro, que não deixa desejar a nenhum outro povo, além de divulgar o trabalho de marcas e patentes de um modo menos sisudo. Todas as patentes que foram citadas nesses contos já estão em domínio público. Os nomes dos inventores foram mudados para garantir privacidade e o meu pescoço. Minha esposa não quis aparecer e me ameaçou com direitos autorais caso divulgasse seu nome sem autorização.
Espero que apreciem essas pequenas histórias.

Escolha o assunto ao lado, em "Marcadores" e, divirta-se!

sexta-feira, 12 de junho de 2009

A Bolsa

Cheguei no escritório mais cedo do que de costume, pois tinha um relatório bem complexo para terminar. Era um motor planar que a universidade estava patenteando. Exigia uma concentração maior de minha parte, por isso pedi que não passassem ligações. Não adiantou.
— Contando com ontem, é a quinta vez que o Paulo está te ligando.
Paulo era um agrônomo amigo meu, lá dos tempos de faculdade. Como já tinha interrompido o relatório mesmo, resolvi atendê-lo.
— Está bem, pode me passar à ligação.
— E aí Paulo, em que posso te ajudar — perguntei para meu amigo.
— P..rra! É mais fácil falar com o Papa — berrou ele.
— Estou muito ocupado terminando um trabalho. Vai, desembucha.
— Desenvolvi uma nova bolsa para coleta de sêmen — disse Paulo.
— Humano! — exclamei.
— Não! Sua besta. É para cavalo.
— Ah! — e o que tem de novo nisso.
— O sistema de coleta é bem mais eficiente do que os outros. Perde-se menos material.
— Certo — respondi. Manda para mim por e-mail umas fotos e um pequeno descritivo.
— Não! — disse o Paulo. É melhor que tu venhas à fazenda amanhã para ver uma coleta. O negócio é bom mesmo.
— Esta bem, esta bem! A que horas?
— Pode ser lá pelas 10.
No dia seguinte, na hora marcada. Estava eu na fazenda, onde haveria a tal coleta.
O negócio funciona da seguinte maneira: primeiro o pessoal trás uma égua no cio e deixa o cavalo ficar bem assanhado. Aí quando o cavalo vai montar a égua o veterinário agarra o pênis do cavalo e o introduz no coletor e faz à coleta.
Chegou o cavalo. O bicho tava em ponto de bala. Doidão mesmo. A égua tava na dela.
Tudo pronto, veterinário a postos, coletor, cavalo e a égua.
— Chega mais pra cá — disse o Paulo. Assim de longe você não vai ver nada.
Aprocheguei-me um pouco mais do cavalo. O bicho me deu uma encarada. Os olhos estavam arregalados, parecia que tinha fumado uns baseados. Uma das orelhas estava reta e a outra tava virada para baixo. Aquele barulho que o cavalo fazia não era relincho. Dava medo!
— Vem pra cá de uma vez homem! — disse o Paulo. O bicho é manso.
— Não está me parecendo que seja essa a condição dele — respondi.
No entanto, pensei: estou muito longe da cerca. Se o cavalo enveredar para o lado de cá não dá tempo de fugir. É melhor ir para lá mesmo.
— Toma aqui! Veste essa luva — ordenou meu amigo.
Olhei para a cara dele com cara de quem não estava entendendo nada, mas achei melhor não contraria, pois não tava em situação de exigir nada.
Paulo entregou para mim o novo coletor e me disse:
— Assim que o cavalo montar na égua tu experimenta — disse ele, me olhando com uma cara preparada.
A minha situação naquele momento era a seguinte: o cavalo tava tão louco que saltitava das patas. O Paulo não parava de rir da minha cara. Eu estava de luvas cirúrgicas. Numa das mãos segurava o coletor. E a outra mão tinha ficado livre. Ah! A égua continuava na dela.
Assim que o diabo do cavalo se assanhou e fez o que sabia fazer por natureza. O Paulo gritou para mim:
— Pega o ca...alho dele e envia no coletor.
Não tive dúvida, respondi de pronto:
— Nem morto eu vou bater p... em cavalo.
Larguei coletor, cavalo, égua e o Paulo, e fui me embora em direção a cerca. Dava para ouvir de longe as risadas do Paulo e do capataz, que a essas alturas já tinha largado a égua.
Putz! Acabei de me lembrar: não falei da bolsa.

O Comunicador

Como sempre faço depois do almoço costumo dar aquela sesteada para não dormir em frente ao computador. É um hábito salutar e evita acordar de sobressalto babando sobre o teclado.
Tinha começado a redação de uma invenção. Era um negócio complicado sobre eletrônica, acho. Não me lembro mais ao certo, quando fui interrompido pela minha secretária, avisando que tinha um cliente me esperando na sala de reuniões para falar comigo. O sujeito tinha telefonado de manhã e marcado uma reunião à tarde, mas a essa altura, eu já tinha me esquecido por completo desse encontro. No entanto, interrompi o meu trabalho e fui conversar com o possível cliente.
Apresentações feitas: fomos ao que interessa.
— No que eu posso lhe ajudar? — perguntei.
— Tenho uma invenção que vai revolucionar a humanidade — respondeu.
— Que interessante! Do que se trata? — indaguei em seguida, — mas, cá com os meus botões, pensei: lá vem chumbo grosso.
— É um comunicador — sentenciou o homem.
— Muito bem! É uma novidade? Um aperfeiçoamento? Como ele é? Você já tem um protótipo?
— Não, ainda não construí um — respondeu.
— Não tem importância! Tem desenhos, esquemas, algum texto que eu possa ler para entender como ele funciona? — ponderei.
— Não. Não tenho nada ainda, mas eu vou te explicar. Não é difícil de entender.
Ao ouvir essa resposta soltei o corpo para trás na cadeira e fiquei esperando à pancada.
— Trata-se de um comunicador intergaláctico! É para me comunicar com os ET´s — proclamou o homem sem remorso algum.
Num caso com esses, a coisa mais difícil é manter a tranqüilidade. Respirei fundo e lasquei:
— Sem dúvida uma novidade. Como vai funcionar?
— Muito simples — respondeu. Minha idéia é construir um capacete ligado a um transmissor.
Fiquei só olhando para o sujeito que continuou a falar.
— Os meus pensamentos vão ser convertidos em um sinal e esse sinal é transmitido pelo transmissor para os ET´s.
Até então eu tinha mantido a compostura necessária para um trabalho desses, mas não consegui me conter e disse:
— Você está de brincadeira!
— Não! — respondeu o homem. É um assunto muito sério. Eles têm se comunicado comigo e eu não tenho como responder para eles. Por isso pensei em fazer um comunicador para isso.
Fiquei atônito olhando para o sujeito sem saber o que fazer: rolar no chão de tanto rir, sair correndo porta a fora...No entanto, me contive e perguntei serenamente:
— Diga-me uma coisa? — perguntei. Esse aparelho vai apenas transmitir as tuas mensagens ou vai receber também?
— Apenas vai transmiti-las, — respondeu.
Ufa! — pensei eu, pelo menos o aparelho não é só Pai de Santo.
— Então, — ponderei com o cliente, — não se trata de um comunicador. É apenas um transmissor.
— Mas eu tenho outra idéia — disse.
Sabe quando a gente fica com aquela cara de pastel: olhando sem ver nada, cabeça completamente oca. Pois bem, era como eu estava. No entanto, a essa altura eu já estava muito curioso para saber qual era a do sujeito, e perguntei:
— Qual é essa outra idéia?
— Muito simples. Faço uma outra caixa que é o receptor. Quando os ET´s vierem me visitar eles levam a caixa para o planeta deles. Aí posso me comunicar com eles sempre que quiser.
A essa altura da prosa eu achei que já era demais.
— Agora já é gozação. Tenho mais o que fazer.
Levantei-me, dirigi-me à porta e, gentilmente, disse que não era possível de patentear o invento dele.
Meio contrariado o sujeito foi-se embora.
Voltei para meu antigo relatório, mas a concentração já tinha ido para o espaço, junto com os ET´s é claro. Eu não sabia se o cara tinha ido ao meu escritório só para tirar um sarro da minha lata, ou se o assunto era mesmo sério. Para ele, é óbvio.
Depois de um tempo, consegui retomar o meu trabalho. No final da tarde recebi uma ligação:
— Engenheiro! — falou o rapaz do comunicador intergaláctico. Vou te deixar o meu telefone se você mudar de idéia.
Fiquei mudo.